Com eleições de Lula, casos de xenofobia aumentaram 821% no Brasil em um ano
Os casos de xenofobia estão sendo, rotineiramente, mostrados na internet e ganhando, em vários casos, repercussão nacional. No Rio Grande do Norte, por exemplo, teve o episódio da influencer Kannada Camila, que perdeu sua conta no Instagram com mais de 200 mil seguidores após falas consideradas xenofóbicas (ela até pediu desculpas, veja aqui).
O curioso é que, por mais que esses casos ganhem destaque na mídia, o número de notícias divulgadas não chegam perto do total de denúncias formalizadas por esse tipo de crime (ódio a imigrantes estrangeiros ou pessoas de outras regiões do país), intolerância religiosa e misoginia (aversão ou incitação ao ódio às mulheres). Afinal, segundo dados divulgados pela Safernet, o número de casos de xenofobia aumentaram 821% em relação ao ano passado, superando a intolerância religiosa (522% de aumento) e misoginia (184% de aumento).
Segundo os dados da organização não governamental a qual o Portal 96 teve acesso, entre 1º de janeiro de 2022 e 31 de outubro de 2022, a Safernet recebeu 54,8 mil denúncias, 39,3% a mais que as 39,3 mil ecebidas no mesmo período do ano passado. Este é o terceiro ano eleitoral consecutivo (2018, 2020 e 2022) em que a Safernet detecta nos dados da central nacional de denúncias um crescimento constante e praticamente uniforme nos crimes de ódio denunciados à central em relação aos anos ímpares, em que não há eleições.
São 7 os crimes de discurso de ódio na internet denunciados à Safernet. Além de xenofobia, intolerância religiosa e misoginia, a ONG também recebe denúncias de apologia a crimes contra a vida, LGBTQIA+fobia, neonazismo e racismo. Desses 7 crimes, apenas as denúncias de neonazismo não acompanharam o crescimento registrado em anos eleitorais anteriores. Isto se deve à explosão de denúncias de neonazismo no Brasil em 2021, motivada principalmente por uma fala neonazista de um apresentador de podcast e por um gesto supremacista de um comentarista de TV, além da intensa cobertura jornalística sobre o crescimento do neonazismo no Brasil.
Dos 7 crimes de ódio denunciados à Safernet, 5 já superaram no último dia 31/10 o total de denúncias recebidas pela Safernet ao longo de todo o ano de 2021: apologia a crimes contra a vida, LGBTQIA+fobia, xenofobia, intolerância religiosa e misoginia. Três dos indicadores registrados até 31/10/2022 já superaram o total de denúncias recebidas em 2018, que já foi uma eleição hiperpolarizada: LGBTQIA+fobia, misoginia e intolerância.
Com relação às denúncias recebidas nos finais de semana de votação, o segundo turno teve mais que o dobro de denúncias: foram 1480 denúncias nos dias 29, 30 e 31 de outubro, contra 656 recebidas nos dias 1, 2 e 3 de outubro _ um aumento de 125,6%.
Crescimento do discurso de ódio nas eleições
Para a Safernet, os indicadores da Central de Denúncias apontam que as eleições são como um gatilho para o avanço do discurso de ódio. Os picos de denúncias crescem em anos eleitorais, se transformando em uma poderosa plataforma política para atrair a atenção da audiência e dar visibilidade e notoriedade aos emissores.
Neste mês de outubro, mais uma vez, o descontentamento com o resultado das eleições, em especial com a ampla votação de Lula no Nordeste, levou novamente a uma explosão de denúncias de xenofobia, fato que já havia sido registrado em 2014, quando Dilma Rousseff venceu Aécio Neves e em 2018 quando a região deu boa votação à Haddad em relação à Bolsonaro.
Diversidade contra a barbárie
Para a Safernet, a repressão penal aos crimes de ódio deve ser acompanhada de ações que promovam a diversidade.
“As eleições tornaram-se um campo fértil para o crescimento do discurso de ódio, que se alimenta de preconceitos já enraizados no imaginário das pessoas. O melhor antídoto contra o discurso de ódio é informação e diálogo, enquanto não formos capazes de escutar e compreender a realidade de quem é diferente de nós, dificilmente vamos conseguir conviver respeitando as diferenças. Por isso a Safernet lançou este ano a segunda edição do SaferLab, apoiando jovens criadores de conteúdo de diferentes regiões do Brasil para produzir contranarrativas que gerem empatia com grupos que historicamente são alvos de discriminação e sensibilizem parte da audiência para serem aliadas na defesa de direitos humanos na Internet”, afirma Juliana Cunha, diretora de projetos especiais da Safernet, responsável pelo projeto.
Além da Central Nacional de Denúncias, que mantém cooperação com autoridades como o Ministério Público Federal, a Safernet realiza ações educacionais, visando a prevenção de crimes e a educação sobre o uso cidadão da internet.
O SaferLab é um laboratório de ideias que apoia o protagonismo jovem na criação de conteúdos sobre direitos humanos para tornar a internet um lugar melhor - com mais diálogo e respeito à diversidade. Oito jovens criadores das cinco regiões do país têm recebido mentorias, workshops e bolsas para criar contranarrativas ao discurso de ódio.
Contranarrativas são histórias que se opõem ou desmontam um senso predominante. São maneiras de se opor e desconstruir narrativas comuns de discriminação e intolerância, mas vão além e têm uma abordagem propositiva, propondo o diálogo, a igualdade, o respeito às diferenças e a liberdade. Isso pode ser feito com fatos, dados, humor, sensibilidade e outras atitudes que promovam experimentar diferentes pontos de vista. Provocar empatia pelos grupos discriminados é um dos objetivos.
Neste ano de 2022, um dos produtos desenvolvidos pelo Saferlab foi a cartilha Eleições sem Ódio.
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