Quatro anos depois de estrear na Netflix com grande sucesso, no final de 2017, chega ao fim a saga dos assaltantes batizados com nome de cidades, liderados por um homem conhecido como O Professor e envolvidos num mirabolante ‘atraco’.
Os últimos 5 episódios de “La Casa de Papel” chegam à plataforma de streaming nesta sexta-feira (3) – essa 5ª e última temporada foi dividida em duas partes e o ‘Volume 1’ estreou em setembro.
Para evitar quaisquer spoilers sobre o desfecho da série, a Netflix blindou “La Casa de Papel, Parte 5, Volume 2”: a imprensa não pôde assistir com antecedência aos novos episódios e, durante a coletiva online com elenco e criadores da série, realizada de Madri, na última terça-feira (30), nenhuma informação pôde ser passada aos jornalistas sobre essa aguardada reta final.
Limitaram-se a dizer que essa segunda parte da última temporada será mais “emocional” do que a primeira, que investiu mais na ação.
“É um pouco distinta, também porque de alguma maneira estamos terminando uma viagem muito longa, rocambolesca, cheio de aventura. Por um lado, temos esse débito de finalizar bem as histórias dos personagens. E emocionalmente nós, os autores da série, necessitamos fechar com muito sentimento essa viagem. Creio que a narrativa mais emocionante foi muito da nossa parte, porque também estamos nos despedindo de todos eles”, explica Ester Martínez Lobato, criadora da série ao lado de Álex Pina.
E, após se tornar um fenômeno do streaming, o que a série deixa como legado? De forma mais direta, foi criado o chamado “Universo de La Casa de Papel”, do qual já fazem parte, a princípio, dois derivados. Um dos personagens queridos dos fãs, Berlim (Pedro Alonso) será protagonista de uma série só sua, que estreia em 2023.
Além disso, “La Casa de Papel” vai ganhar uma versão sul-coreana, com o ator Park Hae-Soo, de “Round 6”, juntando, assim, dois grandes sucessos da Netflix e dando origem a um terceiro produto.
Essa união leva a outro legado de “La Casa de Papel”, este já em andamento desde a estreia de sua primeira temporada na plataforma de streaming. A série foi a primeira de língua não inglesa na Netflix a repercutir mundialmente, o que abriu caminho para que produções de outros idiomas também brilhassem, como a já citada sul-coreana “Round 6” e a francesa “Lupin” – ambas com a 2ª e a 3ª temporada, respectivamente já confirmadas – e a alemã “Dark”.
As 1ª e 2ª temporadas de “La Casa de Papel” já haviam sido exibidas numa TV espanhola antes de migrar para o streaming, explodir globalmente e ganhar novas temporadas. “Era difícil para nós vender a série para outros países, você tinha que ir um por um. Colocando-nos na Netflix, estrear em 191 países e estar nesse ranking acima de muitas grandes produções pôs a indústria (espanhola) num lugar que não nos atrevíamos a pensar chegar”, comenta Álex Pina, um dos autores da série.
Beto Ribeiro, escritor e roteirista da produtora Medialand, ressalta que o mercado de produções espanholas sempre existiu, mas que “La Casa de Papel” abriu espaço para as grandes produções. “Existem outras produções espanholas anteriores a essa que têm a mesma qualidade, só que ‘La Casa de Papel’ trouxe a universalidade de história. Vingança é sempre uma história universal. Em prol de família mais ainda”, afirma Ribeiro, autor de séries como “Investigação Criminal”, “Gamebros’ e “Velhas Amigas”.
Esse cardápio variado de produções passa também por outras plataformas, como a Amazon. “Existem hoje as produções coreanas, principalmente depois de ‘Parasita’ ter ganhado Oscar de melhor filme e filme estrangeiro. O olhar se volta para a Coreia, e chega ‘Round 6’. E para ‘Round 6’ existir, precisou ter antes ‘La Casa de Papel’. ‘Lupin’ foi o sucesso que foi porque ‘La Casa de Papel’ quebrou barreiras, principalmente em países como Estados Unidos, que é um país mais avesso a outras línguas”, observa o roteirista.
Para a jornalista e crítica de TV Edianez Parente, esse sucesso foi importante, em especial, para a produção de origem latina.
“Não deixa nada a desejar para os seriados americanos de aventura, de suspense, tem romance. Abriu a porta para histórias que saem daquele imaginário do latino-americano. Quais eram as histórias que permeavam esse imaginário? O melodrama latino-americano, de marginalidade, de pobreza. Sai um pouco daquele estigma, dos estereótipos”, diz Edianez, integrante da diretoria da Associação Paulista de Críticos de Artes (APCA), onde também é integrante do júri de TV.
“La Casa de Papel” é localizada na Espanha, mas podia ser uma história de qualquer outro lugar do mundo, afirma a jornalista. É o que ela chama de “conteúdo local com apelo global”. “Muito provavelmente outras produções que virão da Espanha vão se beneficiar disso”, acredita.
Os segredos do sucesso
No Brasil, “La Casa de Papel” tem público fiel, que a mantém sempre nas primeiras posições do ranking de mais assistidos. Nas audiências de outros países, não é diferente. Na recente lista de 10 séries de língua não inglesa mais populares da Netflix, a série espanhola ocupa as 2ª, 3ª e 4ª posições, perdendo apenas para “Round 6”, que se encontra na liderança.
Para a jornalista Edianez Parente e o roteirista Beto Ribeiro, o sucesso da série se deve a uma combinação de fatores, sobretudo pela trama atraente e pelos bons personagens, mesmo sem trazer inovações de linguagens. “’La Casa de Papel’ é uma boa história de vingança, e toda história de vingança atrai, desde ‘Conde de Monte Cristo’, de Alexandre Dumas. ‘Revenge’ foi uma série que mexeu muito, porque tratava exatamente disso”, avalia Ribeiro. “A série espanhola mistura ação e drama quase na medida certa, tem um quê policial.”
O roteirista aponta outra caraterística importante: a presença do anti-herói. “Você acaba torcendo pelo vilão e não pelo herói. Em ‘La Casa de Papel’, é impossível você torcer para que a polícia prenda o Professor e sua turma, porque cada um no seu papel tem a sua motivação justa para fazer o que faz. Também é uma boa série de entretenimento, que foge completamente da realidade, isso ajuda bastante também”, afirma ele.
“Então, há todos esses elementos: vingança, anti-heróis muito charmosos e bem estruturados. Tem uma trama, claro, superfantasiosa, mas que você embarca, aceita os exageros do roteiro, que são muitos.”
Edianez Parente também chama atenção para os personagens cativantes, bem construídos, e para a história sedutora. “Há encantamento, essa coisa dos fora-da-lei, que, na verdade, têm o lado humano muito explorado, você torce por eles, além da figura do Professor.”
Figura central da trama, ao redor da qual orbitam os carismáticos assaltantes, O Professor ganhou vida na interpretação precisa de Álvaro Morte. Agora, o ator se despede desse personagem icônico. “Ele me deu muitas coisas bonitas, e de todas elas ter podido desfrutar de estar com uma gente maravilhosa e aprender muito”, disse Álvaro, durante a coletiva de imprensa.
“Daqui a alguns anos, quando eu pensar em ‘La Casa de Papel’, além do todo fenômeno em si, fico com esse trabalho de campo que fazia dia a dia com meus companheiros, com textos maravilhosos e, ao mesmo tempo, muito difíceis de erguer.”
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