Cidade Alta.
Eu, confesso, não sou um puro Xaria. Sou por adoção, e por paixão.
Cheguei na rua Gonçalves Ledo em 1971, após o tricampeonato mundial daquela turma “ruim” de bola comandada por Pelé.
Nascido em São Tomé, tendo vindo em cima da carroceria de um caminhão, com mudança em tudo, em 1965, já havia morado na Rua São Paulo (Alecrim), Vila da Caixa (Quintas) e depois Rua Omar Medeiros, antes, um pouco, da subida do Baldo.
Antes da Cidade Alta mesmo, na Omar Medeiros, rolavam peladas inesquecíveis no Mangueirão, onde hoje é terreno da Caern, perto da Cosern e do viaduto do Baldo.
Foi ali que um desinfeliz chamado “Galego” me colocou o apelido de PPO.
E PPO me acompanhou até me tornar um jogador profissional no Alecrim. E ainda hoje tem quem me chame assim.
A minha história na Cidade Alta, na Rua Gonçalves Ledo começou quando nem tinha calçamento.
As peladas rolavam doidas, mas dificultosas, afinal a rua é inclinada demais.
Por isso, a Santa Cruz da Bica, pelada de dois contra dois, tendo o espaço de um dos bancos como trave, se tornou nosso “Maracanã”.
Muitas vezes a disputa envolvia mais de 30 duplas começando de tarde cedo e entrando pela noite.
Isso quase todos os dias.
Sim, porque a pelada no “campo do Cosern”, na Régulo Tinoco, era somente aos sábados e domingos.
Não dava para ficar tanto tempo sem jogar bola.
Comecei, aos poucos, a conhecer as figuras que fariam, para sempre, parte da minha vida.
Minha primeira amizade mais confiável, se bem me lembro, foi com Carlos Eduardo Linhares Rebouças.
O maior craque de futebol de mesa que vi jogar em toda minha vida, e até hoje. Quantas e quantas surras levei no seu campo, na sua casa.
Foi ele que levou para treinar no América. E quanta generosidade!
Carlos Beijinha, era assim que Olinto Galvão o chamava, jogava de pivô, e eu também fui treinar de pivô.
Quer dizer, ele levou um concorrente forte. Eu, todo mundo dizia, jogava muito futebol de salão, não futsal.
A amizade com Carlos me ligou aos demais peladeiros e tudo que fazíamos, quase sempre, acabava em bola.
Enlouquecíamos a vizinhança com nossos cruzamentos na área, fazendo os portões das garagens de trave.
Nessa época, acho, conheci o Roberto Lili, que sempre estava disponível para ser o goleiro.
Todo lugar servia para jogarmos.
Acho que o América foi minha primeira referência futebolística, de verdade, pois antes meu "mundo" era o Independente (foto) da Cidade Alta, time treinado pelo querido Edval "Burro Preto" entre futebol de salão e campo.
Treinar no América, coisa à parte. Era a melhor coisa do mundo treinar às quartas e domingos na velha quadra da sede social da Rodrigues Alves.
Sentíamos o orgulho de fazer parte de um grande clube, “oficialmente”, acho.
Lembro de nossas “orações” para que nunca chovesse nos dias de treino.
Recordo sempre emocionado da minha primeira medalha de campeão.
Um torneio interno (era menino demais, dava para fazer muitos times) marcado por Olinto e homenageando diretores ou ex-diretores do América.
O meu time tinha como padrinho o Procópio Neto. Fomos campeões, e nunca me sai da memória a alegria do gentil jornalista, que era nosso vizinho da Voluntários da Pátria, pagando lanche para todos nós após a “conquista”.
Saí do América, loucura minha, claro, depois voltei pelas mãos de Arturzinho, uma das figuras mais queridas que conheci na minha história de jogador de futsal e depois jornalista.
Ainda joguei futsal no América por muitos anos, ao mesmo tempo que começava minha carreira no futebol de campo.
Depois de tentar um peneirão no ABC, não joguei nem cinco minutos, me inscrevi no Força e Luz de Ranilson Cristino.
Fiquei no Força e Luz até o final de 1978 (foto), quando foi “negociado” com o Alecrim. Trocado por 30 pares de chuteiras, 30 pares de meiões e 10 bolas.
Ranilson Cristino diz, sorrindo sempre, que “Seu” Bastos, dirigente querido do Alecrim na época, nunca pagou.
E eu bem sei que Ranilson me negociou com o Alecrim torcendo para que eu vencesse na vida como jogador de futebol.
O time verde era terceira força, e me daria mais oportunidades, acreditava.
Futebol de salão no América, futebol de campo no Alecrim, até o dia em que assinei contrato profissional e fiquei privado da bola pesada.
Senti muita, mas muita falta dos meus amigos queridos, mestres, do América – Artur Ferreira, técnico, Cláudio e Nilson,goleiros, Beto Coronado, Exmar Tavares, Juritinga, Ricardo Bezerra, Vem-Vem, Ítalo Anderson e tantos outros.
Joguei futebol por mais de 14 anos no Alecrim, bicampeão jogando em nos anos de 1985/86, emprestado algumas vezes (sempre por brigas com dirigentes) para Botafogo/PB, Treze/PB e Ferroviário/CE.
Só “barca furada”, como se diz. Isso, na época. Não dei sorte nesse quesito empréstimo.
Quando Náutico, Santa Cruz e Vitória quiseram me levar, ano de 1982, talvez a minha melhor fase na vida (treinado pelo querido mestre Ivo Hoffman) “seu” Bastos não me cedeu.
Dizia que eu era “patrimônio do Alecrim”.
Parei de jogar com 30 anos. Fugindo de dirigentes ruins, e de uma imprensa que smepre foi madrasta com os “pratas de casa”.
Ontem, como hoje, a maioria só valoriza jogador de fora.
Talvez por isso, inconscientemente, entrei para o jornalismo para defender os meninos da terra, fazer deles a minha “bandeira”.
Minha lembrança mais honrosa. Claro, os títulos conquistados, mas principalmente o fato de ter recebido muitos elogios do maior comentarista esportivo que o Brasil já produziu.
João Saldanha, no jogo Botafogo/RJ 2 x 1 Alecrim, no Maraca, em agosto de 1986, me colocou na lista de grandes jogadores que tinha visto jogar no maior estádio do mundo.
E chegou a me indicar para o Botafogo, seu time do coração.
Aqui em Natal, “comentaristas” como Lauro Neto, para citar um exemplo, dizia que eu era apenas um “bom jogador”, e ainda compensava: “é muito cabeça quente, não pode jogar”.
Vai ver tinha razão.
Depois do futebol, o futebol. Depois de vidraça, pedra.
Me tornei jornalista esportivo, jornal, depois rádio, depois tevê, e vivo disso até hoje.
Querendo bem. Mesmo que muita gente não me queira tanto.
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