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Política

Governo quer antecipar dinheiro do pré-sal para cobrir rombo nas contas

Lula e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Siveira: governo quer antecipar receitas do pré-sal para tapar buraco nas contas públicas. (Foto: Ricardo Stuckert/PR)
TUDO SOBRE assassinado do ex-prefeito.gif

Pressionado a reduzir o déficit fiscal, o governo Lula quer antecipar a venda da sua parte da produção de petróleo nas áreas do pré-sal que ainda não têm contratos de exploração. A notícia é da Gazeta do Povo.

Um projeto de lei enviado ao Congresso em regime de urgência na sexta-feira (30) autoriza a Pré-Sal Petróleo (PPSA) — estatal criada em 2010 exclusivamente para fazer a venda pública da parcela da União nas áreas em regime de partilha — a leiloar esses volumes. A estimativa do governo é arrecadar entre R$ 15 bilhões e R$ 37 bilhões.

O PL 2632/2025, assinado pelos ministros Alexandre Silveira (Minas e Energia) e Fernando Haddad (Fazenda), abre caminho para que a União transforme imediatamente em dinheiro a produção futura das jazidas.

“A urgência e a relevância da medida decorrem da necessidade de criar alternativa de comercialização do óleo destinado à União que esteja alinhada à consolidação fiscal em curso”, admitiu Silveira, na justificativa do projeto.

 

Ideia é elevar a produção em áreas adjacentes do pré-sal

As áreas a serem leiloadas são compartilhadas e adjacentes ao polígono do pré-sal. São as chamadas “jazidas unitizadas”, que ocorrem quando um mesmo reservatório ultrapassa os limites de um contrato já existente.

Nesses casos, são firmados acordos de individualização da produção (AIPs), que definem como o volume de petróleo será dividido entre a União e as empresas operadoras.

O projeto tem como alvo principal volumes de três grandes campos na Bacia de Santos: Mero, Atapu e Tupi. Segundo relatório da PPSA, a parcela total de petróleo da União nos AIPs foi de 11,63 mil barris por dia em março. O contrato de Mero foi responsável por 65% desse total.

A exploração das áreas adjacentes pode elevar a produção da União para cerca de 30 mil barris de óleo equivalente por dia até 2026, segundo dados de relatório da XP. A expectativa da consultoria é que esse patamar se mantenha até o fim da década, antes de começar um processo natural de declínio.

 

Leilão pode não atrair compradores, diz especialista

Para o economista e consultor na área de energia Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura, os principais interessados nos leilões são os sócios dos campos onde há AIPs com a União, por meio da PPSA.

“Nessas áreas que são unitizadas, quem já está no campo, quem ganhou o leilão, seria o candidato preferencial”, afirma. “O que o governo está dizendo agora é o seguinte: você [sócio] tem determinados blocos de petróleo dos quais sobrou um pedaço, que pode ser unitizado, ou seja, integrado à área já leiloada. Isso é interessante para a empresa que já está lá.”

Mesmo assim, o consultor adverte que não há garantia de interesse por parte dos consórcios, nem quanto ao valor a ser arrecadado. “Os R$ 37 bilhões pretendidos não são ‘favas contadas’”, diz.

Sobretudo porque o governo pretende estipular o preço inicial das áreas com base em um critério de curva de produção — uma projeção que mostra como será a extração de petróleo ao longo do tempo em um campo, indicando quando a produção atinge o pico e quando começa a cair.

“Essa curva é fornecida pela própria ANP [Agência Nacional do Petróleo], que tem seus próprios cálculos”, explica Pires. “Mas ela pode estar subestimada ou superestimada. O maior risco é o governo errar essa avaliação das áreas unitizadas. Se estipular um preço alto demais, não aparece ninguém interessado.”

 

Tentativa de antecipar dinheiro do pré-sal traduz desespero fiscal do governo

Certames desse tipo já fracassaram antes. No leilão dos volumes excedentes da cessão onerosa, em 2019, algumas áreas não receberam propostas. A cessão onerosa foi um contrato firmado em 2010 em que a União transferiu à Petrobras o direito de explorar até 5 bilhões de barris em áreas específicas do pré-sal, mediante pagamento fixo.

No primeiro leilão do regime de partilha, em 2013, no campo de Libra, na Bacia de Santos, também houve baixa concorrência: apenas um consórcio apresentou proposta, liderado pela Petrobras, junto com Shell, Total, CNPC e CNOOC. As duas últimas são estatais chinesas e estão entre as maiores empresas de petróleo do mundo.

“O mercado é assim”, diz Pires. “Dependendo dos valores que o governo colocar, o leilão pode fracassar.”

Para ele, o melhor caminho seria realizar um leilão no modelo tradicional de partilha, como já é feito pela ANP. Nesse caso, o petróleo extraído pertence à União, e as empresas recebem apenas o suficiente para cobrir custos. Uma parte do lucro excedente da produção é dividido entre a União e as empresas, conforme o percentual ofertado no leilão. Quem oferecer o maior percentual à União arremata a área.

“Mas, como o governo está com pressa e precisa de dinheiro imediato por conta do déficit fiscal, quer fazer um leilão no qual o interessado já pague à vista, baseado num critério que ele mesmo vai determinar”, afirma. “Isso traduz o desespero fiscal do governo.”

 

Governo Lula se inspira em Paulo Guedes

A proposta remete a uma ideia já defendida pelo governo anterior, de Jair Bolsonaro (PL), que, na época, sofreu forte resistência do partido do presidente Lula.

Em junho de 2022, por iniciativa do então ministro da Economia, Paulo Guedes, Bolsonaro enviou ao Congresso um projeto de lei similar que, de forma ampla e ambiciosa, autorizava a venda antecipada da parcela de petróleo e gás natural pertencente à União em todos os contratos de partilha do pré-sal.

“O que, na época, o Paulo Guedes falava ia um pouco além”, lembra Pires. “Ele queria vender o pedaço que, nos leilões de partilha, ficou com a PPSA em áreas que já foram leiloadas. Avaliar esses campos, trazer isso a valor presente e vender.”

O projeto de Guedes também previa a desvinculação dos recursos do Fundo Social do Pré-Sal, que até então eram destinados prioritariamente às áreas de educação e saúde, para serem usados conforme as necessidades do Orçamento.

Era uma proposta coerente com a orientação liberal do governo, alinhada a outras medidas que buscavam reduzir o tamanho do Estado. No fim de maio de 2022, um decreto do governo Bolsonaro já havia incluído a PPSA na lista de estudos para uma possível privatização, uma das prioridades do então ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, junto com a da Petrobras.

Parlamentares e lideranças do PT criticaram duramente o projeto na época, argumentando que ele comprometeria a soberania energética do país e retiraria recursos essenciais das áreas sociais. Organizações ligadas ao partido, como a Federação Única dos Petroleiros (FUP), também se manifestaram contra a proposta.

Para Adriano Pires, embora o projeto atual se restrinja a áreas ainda não leiloadas e às adjacências, o artigo 4.º do PL do governo Lula abre uma brecha para que a União, por meio da PPSA, venda sua participação nos campos que já foram leiloados.

“É bem parecido com o que Guedes pretendia fazer”, afirma. “E não há problema em querer antecipar receita. Particularmente, acho que o governo pode gastar como quiser. O problema é a forma apressada como isso vem sendo conduzido”, diz.

Ele destaca, no entanto, a incoerência do governo e do PT, que, na época, acusavam o governo Bolsonaro de estar “entregando o patrimônio público para empresas privadas”.

“O pessoal da oposição falava: ‘O governo está vendendo barato, fazendo leilão, não sei o quê’. Mas e agora? Agora leiloar não é mais entregar o patrimônio? Se fossem coerentes, estariam fazendo as mesmas críticas ao governo Lula.”

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