Estudar para o vestibular e para concursos públicos tornou-se um nicho promissor nas redes sociais. Com vídeos de dicas de rotinas de estudo, materiais e desabafos ante a ansiedade, estudantes constroem comunidades online voltadas aos desafios de se preparar para as provas. A notícia é da Folha de São Paulo.
A hashtag #studytok soma mais de 2,8 milhões de vídeos no TikTok, número que chega a 4,4 mi na tag #study. No Instagram, #studygram acumula mais de 19 milhões de publicação e a hashtag brasileira #studygrambr, 1,2 milhão.
Savana Carvalho, 21, é vestibulanda de medicina com mais de 50 mil seguidores no Instagram. Ela conta ao#Hashtag que decidiu trancar a faculdade de Relações Internacionais na Universidade Federal do ABC para se dedicar ao vestibular. "Eu trabalhava e estudava. Apesar de gostar muito de geopolítica, não é algo que geraria a mudança financeira que busco. Na minha família ninguém fez faculdade", explica.
Ela buscou entender as estratégias usadas por quem foi aprovado no vestibular mais concorrido do Brasil. "Comecei a seguir estudantes e vi que faziam simulados e correções. Percebi que eu não tinha uma noção clara do que era preciso". Ela passou a também compartilhar sua rotina de estudos. "Vi que muitas blogueiras tinham cupons e acesso a materiais de estudo e cursos. Fui atrás de permutas e decidi que conseguiria. Na época, mal tinha 200 seguidores", diz.
Com uma bolsa em um curso de matemática para vestibular, Savana deslanchou nas redes. "Foi incrível ter parcerias e estudar com pessoas capacitadas, algo que eu não acessaria sem a internet. Pude parar de trabalhar e fazer dinheiro de comissões das redes. É uma coisa me ajudando em outra."
Livia Loback, 25, estuda para o concurso do Tribunal Regional do Trabalho e compartilha sua rotina nas redes para mais de 95 mil seguidores. Bacharel em direito, ela não quer advogar. "Escolhi tentar uma carreira no serviço público pela estabilidade".
Ela começou a produzir conteúdo para evitar distrações durante o estudo. "O celular fica parado, gravando. Comecei a postar no TikTok porque é menos pessoal. Depois, migrei para o Instagram e cresci mais."
Assim como Savana, ela não paga pelos cursos e materiais. "É o ponto positivo. Sem a internet eu não teria esses acessos". O ponto negativo é que as pessoas estão sempre prontas para opinar.
Drica Martins, 30, precisou voltar a trabalhar como enfermeira enquanto estuda para passar em medicina. "Quero compartilhar minha rotina porque muitos também estão nessa situação e buscam identificação."
Ela decidiu cursar medicina pois percebeu na rotina hospitalar que preferia outra área de atuação na saúde. "Nunca gostei muito da romantização do ‘estudo perfeito’, em que todo dia dá muito certo. Eu sempre mostro que tenho outras coisas para dar conta, e isso também gera identificação, principalmente com quem já passou do ensino médio."
A professora e coordenadora do cursinho popular Florestan Fernandes, Laura Rocha, diz que esse é um dos fatores mais discrepantes na realidade dos vestibulandos. "É uma romantização da exaustão. Nem todo mundo tem um espaço adequado para estudar em casa. Isso ficou muito claro durante a pandemia."
Uma das propostas do cursinho é ajudar alunos a construírem um cronograma de estudos que funcione com a rotina de trabalho e deslocamento, diz. "Se você já trabalhou o dia inteiro, será mais agradável fazer um exercício de matemática ou ler um dos livros da Fuvest? A resposta depende do perfil do aluno e a partir dela encaixamos o que cabe para cada um diante de suas demandas."
Laura diz que o vestibular afasta os alunos da universidade pública com a noção de que é uma prova muito difícil. "Nosso trabalho é desmistificar certas coisas". Segundo ela, alunos vulneráveis socioeconomicamente não têm o hábito de estudar —seja por falta de espaço, material, suporte tecnológico— então, muitas vezes, a construção do hábito já é um excelente ponto de partida.
"Essa lógica de educação voltada para aprovação é cruel", argumenta. O estudo e o aprendizado não deveriam ser apenas para passar numa prova, mas pelo processo em si. "Aprender deveria ser prazeroso e se conectar com sua realidade, história e vontades. Mas a rotina é tão pesada que se a pessoa não passar na avaliação provavelmente dirá que perdeu seu tempo. Isso é horrível", diz Laura.