O líder ucraniano Volodymyr Zelensky recusou um pedido do governo brasileiro para uma conversa telefônica com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva às vésperas da viagem do brasileiro a Moscou. A informação é da CNN Brasil.
No dia 9 de maio, Lula vai participar na capital russa, ao lado do presidente Vladimir Putin, das comemorações pelos 80 anos da vitória contra os nazistas na Segunda Guerra Mundial.
Representantes de Kiev criticaram a visita do líder brasileiro e afirmaram que a viagem vai consolidar o apoio “aberto” do governo a Putin.
“É uma pena que o governo Lula tenha escolhido esse caminho estranho, ignorando completamente a Ucrânia, desrespeitando abertamente Zelensky e então, de repente, tentando obter de Kiev um álibi e uma desculpa para ir a Moscou apoiar abertamente Putin num horrível desfile militar, mas disfarçando essa intenção sob o pretexto de ‘mediação de paz’”, disse uma alta fonte do governo ucraniano que pediu para não ser identificada.
Representantes de Kiev demonstraram grande incômodo com a provável divulgação de fotos de Lula ao lado de Putin durante um desfile militar na Praça Vermelha que muito provavelmente vai incluir unidades e soldados russos que invadiram a Ucrânia.
“Lula vai, literalmente, mostrar que está ao lado de Putin”, disse outra fonte ucraniana.
A CNN apurou que o governo brasileiro fez formalmente um pedido para uma conversa entre os dois líderes no início de abril, mas Kiev simplesmente alegou problemas de agenda para recusar o contato.
Zelensky e Lula estiveram no funeral do papa Francisco em Roma, no último sábado (26), mas não chegaram a se encontrar.
O líder ucraniano, no entanto, se reuniu com o presidente Donald Trump em plena Basílica de São Pedro e também encontrou espaço na agenda para se encontrar com vários outros líderes europeus.
Procurado pela reportagem da CNN, o Itamaraty preferiu não responder às críticas de Kiev.
Uma fonte do governo, no entanto, disse que a recusa de Zelensky em falar com Lula não vai mudar a posição do Brasil com relação à guerra.
Desde o início, Brasília condenou a invasão russa, inclusive em todas as votações sobre o tema na ONU, e também sempre defendeu a posição de que o conflito só poderá ser resolvido pela diplomacia.
Pedindo reserva, a fonte brasileira disse que chama a atenção o fato de o governo ucraniano apresentar uma postura mais agressiva com o Brasil do que, por exemplo, com os Estados Unidos – mesmo depois do bate-boca entre Zelensky e o presidente americano Donald Trump em plena Casa Branca.
No Itamaraty, importantes embaixadores lembraram que “todos conhecem a posição do Brasil e não adianta Kiev tentar descaracterizá-la”.
Antes do governo ucraniano ter recusado o contato com Lula, o assessor especial da Presidência da República para assuntos internacionais, embaixador Celso Amorim, disse à CNN que o Brasil sempre conversa com todos os lados envolvidos em conflitos e questões diplomáticas.
“Sempre conversamos com todos. Mas sempre achamos que o diálogo deve envolver as duas partes. Até pouco tempo atrás não havia perspectiva de que isso pudesse acontecer. Agora, a situação mudou. E o Presidente vai à Rússia, por isso é natural que escute o presidente ucraniano”, disse ele.
Impacto nas relações bilaterais
Segundo uma fonte ucraniana, a visita de Lula a Moscou pode complicar as relações entre os dois países.
“A participação de Lula nesse show de propaganda russa terá consequências negativas para as relações bilaterais”, afirmou a fonte.
Zelensky já convidou diversas vezes o presidente brasileiro para visitar a Ucrânia e ver com os próprios olhos a realidade da guerra.
Lula enviou Amorim para visitar o país em guerra ainda em 2023. O embaixador também continuou em contato com as autoridades ucranianas, mas a confirmação da visita a Moscou parece ter azedado de vez o diálogo com Kiev.
As relações podem se complicar ainda mais com a mudança programada na embaixada da Ucrânia em Brasília. Em breve, o embaixador Andrii Melnyk vai assumir a chefia da missão ucraniana na ONU, em Nova York. Kiev, no entanto, não anunciou quem o substituirá.
Uma das formas de mostrar descontentamento de forma diplomática é justamente não apontando um novo chefe para a missão diplomática em Brasília – o que, na prática, significa uma diminuição nas relações bilaterais.