Após ocupação militar, alunos melhoram notas e criminalidade despenca na Comunidade do Japão
Antes com alto índice de evasão, hoje com disputa por vagas, a Escola Estadual Maria Ilka de Moura, que fica no Bom Pastor, mudou da água para o vinho. Construída em 1980, a unidade escolar de ensino fundamental quase fechou as portas em 2017. De acordo com membros da direção, a situação de abandono assustava tanto os alunos quanto os professores. Roubos, furtos e depredação eram comuns no dia-a-dia, mesmo sendo vizinha ao Comando do nono Batalhão no bairro.
A situação na Maria Ilka começou a mudar quando a Polícia Militar realizou a "ocupação" no local. Encabeçadas pelo capitão da PM e, hoje, senador, Styvenson Valentim, ações para recuperar a parte estrutural e moral do lugar foram realizadas. Um consenso com o conselho escolar permitiu que policiais, voluntariamente, tivessem maior acesso ao lugar e contribuíssem para a segurança e organização.
Apesar de todas as mudanças já vivenciadas, Styvenson quer uma maior. Um projeto para a construção de uma unidade escolar mais moderna, com capacidade de suportar até estudantes do ensino médio. O projeto ampliaria o espaço para ter 14 salas, estacionamento, campo de futebol, ginásio poliesportivo. De acordo com o parlamentar, a falta de interesse do Estado implica no andamento da obra.
Mesmo com o custo de R$ 6 milhões, o estado não precisará arcar com a obra. Segundo Styvenson, a verba já foi obtida junto ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), e cabe ao Governo apenas assinar o termo para licitar a construção.
De acordo com a diretora do local, professora Jaiane Dantas, antes mesmo do ingresso da polícia na rotina da escola, a sua gestão já havia procurado o Governo do Rio Grande do Norte para tentar modificar a realidade, mas foi "vencida pelo cansaço" e acabou "desistindo" de tentar sem obter retorno da Secretaria da Educação, da Cultura e do Esporte (SEEC).
"É importante frisar que, antes desse processo de reorganização, havia uma busca incessante da gestão para tentar transformar a realidade da escola. Procuramos o órgão competente que é a Secretaria de Educação do Estado e cansamos de tanto ir atrás˜, relatou.
O novo símbolo do local é uma fênix. Para Styvenson, o animal mitológico é a representação do renascimento da escola após os momentos de dificuldades que o lugar já passou. O senador diz que um dos motivos que o fez se interessar pela Maria Ilka foi o lixo jogado pela população.
"Quando você joga lixo em algum canto, você despreza. E não era pouco não. As pessoas realmente pegavam sacos e caixas de lixo e despejavam aqui", contou.
Desde a chegada dos policiais ao local, não apenas o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) da escola melhorou, mas também os arredores do local. O número de homicídios, por exemplo, da Comunidade do Japão, vizinha à unidade de ensino, zeraram desde a "ocupação" da PM. Em um dos relatos feitos à Reportagem, um traficante chegou até a ameaçar um dos membros da diretoria para conseguir uma vaga para seu filho na Maria Ilka. O motivo: não queria que o jovem tomasse o mesmo "rumo" que o seu.
Segundo a direção, antes da ocupação, pelo menos dez ex-alunos morreram, em um curto período, após abandono da instituição e envolvimento com o tráfico de drogas.
De acordo com dados obtidos com pelo Instituto de Pesquisa Observatório da Violência (OBVIO), em 2016, o número foi de três homicídios. No ano quando a Maria Ilka começou a parceria com os policiais, em 2017, o índice caiu para um e só voltou a ter outro em 2019. Em 2020 e 2021 não foram registrados crimes do tipo. Em números extras obtidos pela Reportagem, em 2014 e 2015, a média era de 3 homicídios dolosos.
Perfilados e com fardamento impecável, os jovens participam de um rito diário na canção do hino nacional antes de entrarem em sala de aula, uma tradição antiga no âmbito escolar, resgatada na escola estadual. Diariamente, um dos jovens é selecionado para comandar o momento. O intuito, segundo Styvenson, é criar o senso de responsabilidade, coletividade e liderança desde cedo.
A participação dos militares no local não interfere no ensino. As ações policiais geralmente acontecem fora de sala de aula, na orientação "pelo respeito e pela disciplina". Ações para evitar o bullying, a violência e a sexualidade infantil são implantadas constantemente no local. Os pais também são obrigado a irem deixar os alunos todos os dias.
Um dos militares que faz parte do projeto desde o início, o cabo Leite também é um educador. O policial concilia sua função com sua ajuda à escola. Mesmo após sair tarde do trabalho, o PM participa das atividades matinais da Maria Ilka e, até cobre a ausência de professores, quando necessário. Leite avaliou como positivo o impacto da construção e afirmou que auxiliaria ainda mais no desenvolvimento da educação na região.
"O impacto vai ser muito bom para as crianças. Como costumo dizer, sou um formador de sonhos e todo dia construo algo novo aqui na escola. É tudo por amor mesmo. Saí ontem do trabalho às 23h e estou aqui pela manhã", relatou.
No tocante ao Ideb, a escola superou, em 2019, a meta estabelecida, que era de 3,3. O último índice da Escola Estadual Maria Ilka Moura é de 4,9. Em 2015, a unidade de ensino atingiu 2,5, isso quando o pretendido era uma média de 2,8. Por conta do quase fechamento do local, a unidade de ensino não participou do Ideb em 2017, de acordo com dados do QEdu, que registra informações de avaliações do Ideb/Inep.
Por conta da boa fama que a Maria Ilka conquistou, a unidade de ensino recebe alunos de outros bairros e até de outros municípios, como São Gonçalo do Amarante. Antes, até carros de som eram pagos para poder tentar chamar alunos para se matricularem.
Por ainda não ter iniciado sua reforma estrutural, após concluir o 9º ano, para o ingresso no Ensino Médio, os alunos se despedem da escola. Apenas após a obra, deven ser abertas as vagas para novas turmas para dar continuidade no ensino.
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