A divisão dentro do governo federal sobre o veto ou sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao projeto de lei que flexibiliza o licenciamento ambiental, aprovado pela Câmara dos Deputados na semana passada, também reflete-se na sociedade civil. Nos últimos dias, tanto redes ambientalistas, que defendem a derrubada integral do texto, quanto entidades ligadas ao agronegócio e à indústria a favor das mudanças remeteram documentos ao Planalto para pressionar a gestão petista.
A notícia é do jornal O Globo. De um lado, a ala à esquerda do governo, capitaneada pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, articula o veto pelo menos parcial ao projeto, alvo de críticas de pesquisadores e cientistas. Do outro, auxiliares de Lula com viés mais desenvolvimentista, grupo que inclui até petistas como Rui Costa, titular da Casa Civil, defendem que as mudanças podem ajudar a destravar obras pelo país, inclusive com dividendos eleitorais. Também estão neste segundo grupo ministros como Carlos Fávaro (Agricultura), Alexandre Silveira (Minas e Energia) e Renan Filho (Transportes).
Em nota técnica enviada ao Planalto, a rede ambientalista Observatório do Clima, que reúne mais de 130 organizações, defende o veto integral por entender que o texto aprovado no Congresso é “incompatível com o interesse público e inconstitucional, uma vez que desmonta fundamentos técnicos e jurídicos essenciais à operacionalização”. A análise aponta que uma eventual sanção das novas regras criaria um “caos regulatório” que ameaçaria a proteção ambiental, a saúde pública e os povos e comunidades tradicionais, além do patrimônio histórico-cultural e os sítios arqueológicos.
“Em vez de estabelecer um marco legal sólido, como uma lei de diretrizes gerais capaz de uniformizar e direcionar a forma como se realiza o licenciamento em todo o país, o texto proposto cria um cenário de caos regulatório, fragilizando a avaliação de impactos ambientais, a análise de riscos, a participação pública e o controle ambiental”, diz a nota, de 95 páginas.
Os pesquisadores destacam ainda que, dos 66 artigos da proposta aprovada pela Câmara, foram identificados "retrocessos graves" em, pelo menos, 42 deles. Os outros, segundo o documento, têm caráter acessório ou limitam-se a repetir resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).
“O Observatório do Clima, junto às entidades que compõem a sua rede, recomenda o veto integral ao PL 2.159/2021. Reunindo-se os dispositivos da proposta que contrariam o interesse público e os que conflitam com a Constituição Federal, tem-se a essência da lei aprovada”, arremata a nota técnica.
‘Modernização do Estado’
Já um grupo de 90 entidades, sobretudo associadas aos setores de agronegócio, indústria e energia, enviou uma carta a Lula com um pedido de sanção integral do projeto. Na lista de adesões estão a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprasoja), a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) e a Associação Brasileira de Energia Fotovoltaica (Absolar).
Os signatários pedem a sanção integral como sinal de compromisso do governo federal com a “modernização do Estado, o fortalecimento da proteção ambiental, o desenvolvimento social e econômico do país e o respeito à soberania do Congresso Nacional”. Para as entidades, o texto aprovado “corrige distorções ao propor um marco legal unificado e nacional, capaz de consolidar as diversas normas hoje dispersas e oferecer uma base clara, técnica e segura para os entes federativos”.
“Reafirmamos que não apoiamos propostas que enfraqueçam ou desestruturem esse importante instrumento de proteção ambiental. Portanto, é inegável a urgência de reestruturação e racionalização do sistema atual, que carece de eficiência, previsibilidade, agilidade e imparcialidade técnica”, sustenta o documento.
A carta pontua também que a “legislação vigente é marcada por burocracia excessiva, sobreposição de competências e insegurança jurídica, o que transforma o licenciamento em um processo lento, fragmentado e, muitas vezes, ineficaz — sem ganhos reais para o meio ambiente ou para a sociedade”. As entidades ainda “expressam o compromisso com o licenciamento ambiental como ferramenta essencial para assegurar que as atividades produtivas estejam em conformidade com o uso sustentável dos recursos naturais, a preservação ambiental para as futuras gerações e a segurança pública”.