Senadores rejeitaram, nesta quinta-feira, por 4 votos a 3, o relatório final da CPI das Bets, sete meses após o início dos trabalhos do colegiado. O relatório apresentado pela senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) pediu o indiciamento das influenciadoras Virgínia Fonseca, Deolane Bezerra e de outras 14 pessoas, incluindo empresários e representantes de casas de apostas. A informação O Globo.
Caso tivesse sido aprovado, o documento seria encaminhado ao Ministério Público Federal que avaliaria a existência de elementos para abrir uma investigação. Como houve a reprovação, o documento não será remetido a órgãos públicos.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP) negou um pedido anterior a estender o prazo dos trabalhos, dizem aliados, sob o argumento de que os senadores tiveram tempo suficiente e que as sessões estavam se tornando uma espécie de “show midiático”. A última sessão da CPI foi esvaziada e teve dificuldades para atingir o quórum mínimo para iniciar a votação do relatório final. Senadores chegaram a cogitar manter a sessão aberta, até que o número regimental fosse atingido.
O senador Eduardo Girão (NOVO-CE) disse que a CPI "prevaricou" em alguns pontos.
— Esta CPI optou por algumas omissões, deixou de cumprir seu deve e seu poder fiscalizador. Entendo que os números dessa comissão foram tímidos, diante da complexidade da matéria analisada. Um investigado por esta CPI teria dado carona em seu jatinho a um membro desta CPI, que não foi excluído do colegiado. (De acordo com reportagem da revista piauí, o senador Ciro Nogueira (PP-PI) viajou para a França, onde acompanhou o Grande Prêmio de Mônaco de Fórmula 1, em uma aeronave pertencente a Fernando Oliveira Lima, dono da One Internet Group, empresa que investe no ramo de bets). Não ouvimos Lobbystas, deputados e empresários — afirmou.
Soraya Thronicke respondeu.
— Nós dicutimos, neste colegiado, enquanto o tempo permitiu. O problema é identificar lavagem de dinheiro, forma de pagamento, irregularidades na publicidade. Precisamos regulamentar e tributar com mais severidade — disse.
Após a sessão, a senadora afirmou que, apesar do insucesso na aprovação do relatório, vai encaminhar as investigações para autoridades.
— Isto (a reprovação do relatório) não me impede de levar a documentação que reunimos às autoridades competentes. Eu vou marcar com a PGR, o ministro da Justiça, o secretário de Defesa de Consumidor e o ministro da Fazenda e o presidente da República — disse.
O relatório final da CPI cita que Virgínia reconheceu, em depoimento ao colegiado, que se valia de uma “conta simulada” para fazer as apostas, durante as peças de publicidade feitas para a internet, o que configura “propaganda enganosa com com obtenção de vantagem indevida mediante indução a erro”. “Ao induzir em erro seus milhões de seguidores — que acreditaram que suas ‘apostas’ eram reais —, e obter vantagem indevida — em razão das apostas realizadas por parte desses seguidores, que renderam milhões ela e às Bets que representou —, há indícios de que Virgínia tenha cometido o crime de estelionato”, escreveu a senadora.
A parlamentar ainda afirma que apesar de Virgínia ter negado receber o chamado “cachê da desgraça” das empresas, que prevê que quanto mais seguidores perdem, mais o influenciador ganha, o contrato dela inclui um adicional de 30% do lucro gerado para a bet. “Portanto, eufemismos à parte, chamemos as coisas pelo seu nome: essa cláusula estabelece que os ganhos da influenciadora estão atrelados às perdas incorridas por seus seguidores”, diz o texto.
Já em relação a Deolane, a relatora da CPI pede a responsabilização da advogada e influenciadora por sua ligação com a bet Zeroum, que não tem autorização do governo federal para atuar no país. A empresa opera hoje por meio de uma decisão judicial, após conseguir aval de funcionamento no Rio por meio da Loteria do Estado do Rio de Janeiro (Loterj).
A senadora afirmou que, apesar disso, a influenciadora divulgou falsamente que a Zeroum “teria autorização do órgão federal para atuar em âmbito nacional”: “A ocultação da verdadeira condição de Deolane na empresa, que se viu representada por possíveis “laranjas”, com repasses a título de propaganda, pode caracterizar, também, o delito de lavagem de dinheiro”.
Além disso, o texto afirma que a influenciadora vendeu sua participação na empresa por R$ 30 milhões, sem que houvesse qualquer registro de pagamento. Ainda assim, o relatório final da CPI afirma que, embora não conste mais no quadro societário, “há vários indícios de que Deolane continua à frente da empresa”.
O texto do relatório ainda afirma que Deolane e seus filhos registraram movimentações financeiras incompatíveis com as suas declarações de Imposto de Renda.
Pelas redes, Deolane comentou o relatório. “Tá faltando nomes aí”, escreveu a influenciadora em uma publicação na qual listou os nomes incluídos no relatório apresentado pela relatora da CPI das Bets.
A Zeroumbet, por sua vez, afirmou, em nota, ver “com estranheza” o relatório final da CPI das Bets. “O documento contém desinformações e inconsistências que, a bem da verdade, devem ser devidamente esclarecidas. Deolane não é sócia da empresa, como sugere o relatório. Ela é contratada como embaixadora da marca. Outras pessoas citadas no relatório não são sócias da empresa, mas administradores”, diz o comunicado.
Fim do 'tigrinho'
Além dos pedidos de indiciamento, o relatório sugere propostas de lei que regulamentem o setor. Um dos projetos sugeridos pede o fim da publicidade de apostas em eventos de temática esportiva. Além disso, uma proposta propõe proibir beneficiários de programas sociais do governo federal de apostar em bets.
— Precisamos fazer com que o Brasil avance na regulamentação deste tipo de serviço, trata-se de uma resposta sistêmica proporcional ao problema enfrentado — disse Soraya.
A senadora sugeriu ainda a proibição de jogos on-line como o do Tigrinho, por ter maior potencial viciante. A parlamentar defendeu, contudo, a manutenção das apostas esportivas, as bets, desde que sejam adotadas “medidas de regulação mais rígida”. Ela alegou que essa prática trouxe ganhos ao esporte nacional, sobretudo o futebol, que recebeu grande injeção de recursos.