Palácio dos Esportes hoje tem acentos e capacidade para mais de mil pessoas / Foto: SEL
Ciro Marques e Júnior Lins
Natal tem alguns palácios famosos. Tem o Palácio Felipe Camarão, sede da Prefeitura. Tem Palácio Potengi, conhecido como Palácio da Cultura, um prédio histórico que abrigou a Assembleia Provincial. Tem o Palácio Padre Miguelinho, que abriga a Câmara Municipal de Natal. Contudo, possivelmente, nenhum desses está associado a um número tão elevado de fatos históricos e populares do último meio século quanto o Palácio dos Esportes Djalma Maranhão.
Apesar de muito provavelmente já ter vivido o seu auge com relação ao público, já que atualmente cabe um número de pessoas bem menor, o Palácio dos Esportes segue sendo uma grande opção para sediar eventos esportivos, culturais e até políticos. Para se ter uma ideia, apenas em 2022, após a pandemia da Covid-19, foram 65 eventos abertos, entre competições, partidas e até cultos religiosos, conforme números disponibilizados pela Secretaria de Esporte e Lazer de Natal (SEL). Isso equivale a, praticamente, um evento a cada cinco dias, além de sediar escolinhas de esportes e reuniões administrativas.
Celeiro de ídolos do esporte potiguar
É importante destacar que, por mais que, atualmente, a importância do Palácio dos Esportes possa ser dada com base em números da SEL, foi o calor da emoção do passado que o fez ter a importância que tem nos dias atuais. Afinal, foi lá onde ocorreram grandes rivalidades esportivas, os primeiros passos de ídolos locais e, até mesmo, o nascimento de um esporte que, nos dias de hoje, está entre os mais populares do mundo.
O primeiro exemplo que pode ser dado é a disputa entre ABC e América no futsal. Se prestes a completar 59 anos, o Palácio dos Esportes (inaugurado em 27 de dezembro de 1963) não recebe mais grandes partidas de futebol de salão entre as duas maiores rivalidades futebolísticas do Rio Grande do Norte, nas décadas de 70 e 80 era lá onde jogadores e torcedores se encontravam - e se provocavam.
Nesse período, ABC e América tinham grandes times, até em nível nacional, nas disputas do futsal, o que fazia um enorme público se aglomerar no ginásio para assistir as partidas. Ex-jogador de futebol e bicampeão potiguar pelo Alecrim (no futebol de campo), o jornalista Edmo Sinedino, de 64 anos, lembra com saudosismo daquela época.
Isso porque foi no Palácio dos Esportes alguns dos primeiros "chutes" dele numa bola de futebol, ainda em 1978, quando treinou na escolinha do América e jogou também, alguns anos depois, no time adulto. Edmo conta que a repercussão dos eventos no local era tão grande que uma situação vivida no local culminou no seu primeiro contrato profissional.
"Os eventos eram grandes, sempre lotados e com a essência do que realmente é o esporte. A popularidade era tão grande que os jogos tinham transmissão no rádio. Na época, eu já treinava no Alecrim e dizia para meu técnico que era apenas um jogo amador. No entanto, quando ele ouviu meu nome, criou uma celeuma enorme em cima disso e foi graças a visibilidade das partidas a partir do Palácio dos Esportes que acabei assinando meu primeiro contrato profissional", revelou.
Por conta das dimensões atuais da quadra do ginásio, o Palácio acabou "impedido" de receber partidas oficiais de futsal adulto, com base no novo regulamento para competições oficiais.
Contudo, a história do Palácio dos Esportes está longe de se limitar ao futsal. Nas décadas de 80 e 90, o natalense também deixava suas casas e ia até o ginásio assistir a grandes eventos de artes marciais. Prova viva disso é o ex-lutador Adenúbio Melo. Aos 55 anos, Adenúbio relembra como foi participar e organizar eventos no Palácio dos Esportes, o berço do full contact, boxe e, ainda, do vale-tudo.
"O Palácio é um marco. Lá, entrei pela primeira vez em um ringue e consegui meu primeiro patrocínio. Muitos sonharam com isso, assim como eu. Lutei, em 1995 contra Falcão (destaque do esporte na época). Ele era mais pesado e achava que ia me derrotar. Com o local lotado, venci por nocaute nos primeiros minutos", contou Adenúbio, que foi tricampeão brasileiro em full concact, depois migrou para o boxe e voou ainda mais alto: foi tricampeão mundial.
Adenúbio e outros apaixonados pelas artes marciais, inclusive, ressaltam que é bem provável que, se não fosse o Palácio dos Esportes, o RN não teria chegado tão longe no atual MMA, tendo feito campeões dessa modalidade, como os irmãos Patrício e Patrick Pitbull e Renan Barão. Isso porque na década de 90, o ginásio recebeu também vários eventos do chamado "vale-tudo", uma espécie de propulsor das artes marciais mistas.
E quem lembra de vale-tudo, recorda também de uma luta histórica entre Ênio Miranda e Gilvan "Demolidor", um dos maiores e mais folcloricos eventos esportivos do Rio Grande do Norte. Com o Djalma Maranhão lotado, o público ficava muito próximo do ringue e imagens resgatadas mostram como funcionava a antiga estrutura para eventos (veja o vídeo abaixo). Porém, é bem verdade que foi nesse período que o Palácio dos Esportes pode ter conhecido o seu "limite", diante do fato de que a pancadaria acabou saindo do ringue, indo para as arquibancadas e fazendo o "vale-tudo" ser suspenso na Capital.
Reforma e renascimento
É claro que nem tudo são flores. Após alguns anos de abandono, com redução de público por causa da insegurança e falta de manutenção preventiva, o Palácio dos Esportes chegou aos anos 2000 de forma "sofrida". O ponto mais baixo desse momento ocorreu em 2013, quando o Palácio passou por uma lenta e dolorosa reforma que só foi finalizada em 2016 e custou mais de R$ 1 milhão.
Muitas mudanças foram feitas e o Palácio teve suas portas fechadas. O local passou por uma restauração na estrutura de concreto, troca das instalações elétricas e hidráulicas, mudança do piso da quadra, colocação de 1.190 assentos na arquibancada, pinturas interna e externa, instalação de novos refletores e implantação de sistema de acessibilidade, com a construção de rampas de acesso na entrada e nas saídas de emergência. Também foi construído um auditório com capacidade para 80 pessoas.
Após a reinauguração, pode-se dizer que um dos pontos altos da "praça desportiva" foi o campeonato Panamericano de Basquete Master, em 2018. Na ocasião, foram mais de 1.400 atletas amadores e profissionais, masculino e feminino, a partir dos 35 anos, distribuídos em 174 equipes que disputaram o título de cada uma das 14 categorias em disputa no torneio.
Pandemia e vôlei
O Palácio deixou de ser, mais uma vez, dos Esportes durante a pandemia. No pico da Covid-19, quando a necessidade de salvar vidas superou o amor pelas disputas esportivas. O Palácio Djalma Maranhão foi transformado em um "Centro de Atendimento para Enfrentamento ao Coronavírus". Nesse período, o natalense passou a ir lá para se vacinar, do lado de fora, ou para buscar consultas médicas, testagem Swab e acesso a tratamento, dentro do ginásio.
A pandemia esfriou e o Palácio foi devolvido ao mundo esportivo em grande estilo: foi adotado pelo time de vôlei Funvic Natal, que disputou a elite do vôlei brasileiro. Além disso, escolinhas de esportes e competições amadoras. A secretária de Esporte e Lazer da capital potiguar, Jódia Melo, ressaltou o momento de pluralidade entre os esportes no Palácio, como forma de atrair público de admiradores de diversas modalidades.
Funfic trouxe a elite do vôlei brasileiro para Natal / Foto: SEL
O local sedia escolinhas de judô e de vôlei pelo Programa de Esporte e Lazer na Cidade (PELC) da Prefeitura do Natal. As aulas acontecem de forma gratuita para jovens entre 9 e 15 anos. Abriu também as portas para campeonatos de crossfit, xadrez e até mesmo E-esportes neste ano.
"O Palácio passou por uma revitalização nos anos de 2015 e 2016. Depois disso, em 2017 começou uma nova gestão que retomou os eventos aos poucos. Porém, chegou a pandemia e tivemos que parar. Nessa retomada da pandemia, a gente imaginou um palácio dos esportes que pudesse abraçar muitas modalidades esportivas. Essa é a ideia. O Djalma Maranhão tem uma capacidade de 1 mil pessoas sentadas e tudo que queremos é ver o ginásio sempre lotado e receber eventos que o público merece. Fazer essa diversificação das modalidades é nossa prioridade, para atingirmos o maior número de pessoas possível", relatou.
Titular da SEL, Jódia Melo / Foto: Júnior Lins
Outro ponto citado pela secretária foi a abertura para grandes eventos, sem que sejam de cunho esportivo, no local. O ginásio sempre esteve aberto para receber diversas atrações, no intuito de levar o lazer para o natalense.
"Aqui é um patrimônio histórico, praticamente. Quem nunca viveu no Palácio uma linda história? Desde a época do Jern's. Seja como atleta, torcedor ou pai. O Djalma Maranhão tem uma história linda. Shows aqui dentro. A parte cultural também é algo importante. Nas zonas Sul e Leste, é nossa única opção de ginásio municipal", disse.
Escolinha de judô / Foto: SEL
Djalma Maranhão
Dono do nome do Palácio dos Esportes, Djalma Maranhão foi prefeito de Natal e deputado estadual e federal do Rio Grande do Norte. Djalma foi também professor de educação física e jornalista, fundador e diretor de jornais. Seu mandato ficou marcado pela sua militância e a forma que saiu do cargo executivo na capital potiguar. Em 1963, inaugurou o Palácio.
Djalma foi eleito deputado estadual em 1954. Além disso, precisou assumir a Câmara Federal entre os anos 1959 a 1960, como primeiro suplente. Exerceu o cargo de prefeito de Natal em duas ocasiões: a primeira, na segunda metade da década de 1950, por nomeação do governador Dinarte Mariz e a segunda, em 1960, na primeira eleição direta para a prefeitura da capital.
Após o golpe de estado de abril de 1964, Maranhão foi deposto da prefeitura, e teve seu mandato cassado. Preso em quartéis do Exército em Natal, na ilha de Fernando de Noronha e no Recife, só foi libertado por ordem do habeas corpus do Supremo Tribunal Federal (STF), em dezembro de 1964 e asilou-se na Embaixada do Uruguai. Morreu aos 56 anos de idade e seus restos mortais repousam no Cemitério do Alecrim.