Ao menos 30% dos conselheiros dos tribunais de contas no Brasil têm algum grau de parentesco com políticos. Alguns foram nomeados pelos próprios irmãos, cônjuges ou outros familiares que ocupam cargos no Executivo. O número assusta, mas não surpreende. O aparelhamento das cortes que deveriam fiscalizar o uso do dinheiro público tem se tornado prática comum — e longe de ser monopólio de um partido. A maioria dos atuais 232 conselheiros chegou ao cargo indicada por aliados políticos, após uma trajetória em cargos eletivos ou de confiança. Pelo menos 32% já foram condenados ou são investigados por crimes como corrupção, peculato e improbidade administrativa. A informação é do jornal O Globo.
Com salários de R$ 41,8 mil, foro privilegiado e estabilidade até os 75 anos, os conselheiros aprovam ou rejeitam contas de prefeitos, governadores e até presidentes, podendo torná-los inelegíveis. Apesar da proibição do nepotismo na administração pública, a nomeação de familiares para esses cargos segue sendo permitida por decisão do STF, que considera os tribunais de contas como cargos de natureza política.
É justamente essa brecha que permite episódios como os que envolvem ministros do governo Lula. Quatro deles conseguiram emplacar suas esposas como conselheiras dessas cortes. Rui Costa (Casa Civil) tenta indicar a mulher, Aline Peixoto, na Bahia. Wellington Dias (Desenvolvimento Social) já conseguiu nomear Rejane Dias no Piauí. Waldez Góes (Integração e Desenvolvimento Regional) indicou Marília Góes no Amapá. E Renan Filho (Transportes) garantiu uma cadeira em Alagoas para a esposa, Renata Calheiros.
O problema não está apenas nos laços familiares, mas no potencial conflito de interesses. No Pará, por exemplo, o governador Helder Barbalho (MDB) indicou a tia e o ex-vice-governador — que é réu por suposto desvio de quase R$ 40 milhões. No Amazonas, o caso foi ainda mais simbólico: um pai se aposentou e o filho, presidente da Assembleia Legislativa, se autoindicou à vaga.
Na prática, muitos conselheiros julgam as contas de quem os indicou ou de seus próprios parentes, o que compromete a imparcialidade das decisões. Para a Transparência Brasil, isso mina a credibilidade das instituições e transforma os tribunais de contas em verdadeiras capitanias hereditárias do poder.